Biblioteca da Cultura Portuguesa - A segunda casa de João de Deus Ramos
 

João de Deus Ramos encarava o Museu João de Deus como uma biblioteca da cultura portuguesa, onde os eruditos podiam ter acesso a bibliografia não só sobre João de Deus, mas também sobre Arte, História, Literatura Portuguesa e Pedagogia.
Sendo o Museu João de Deus uma instituição centenária, ele está impregnado do pensamento museológico e cultural do início do século XX. Tudo foi pensado ao detalhe para este espaço, desde o projeto arquitetónico com cânones harmónicos, ao desenho do mobiliário adequado à sala de conferências, às estantes cuidadosamente feitas para albergar livros de várias dimensões, ao rigor empregue na catalogação do espólio bibliográfico, passando pela criação dum ex-libris para identificar os livros do acervo.
Desde a sua inauguração em 1917 que existe uma política de incorporações. Algumas obras foram incorporadas por doação ou por oferta dos próprios autores, enquanto outras foram adquiridas em leilões ou através da compra de livrarias particulares.
A visão que o Museu João de Deus era também um centro de cultura está patente na análise das iniciativas literárias, pedagógicas e culturais que periodicamente se realizavam, mostrando uma diversidade de espectro de ideias, de temáticas e de posições políticas das pessoas convidadas. Foram inúmeras as iniciativas culturais nas quais João de Deus Ramos participou como anfitrião ou dando o seu contributo em comunicações orais.
Por outro lado, cumprindo com a sua função cultural, algumas peças do seu espólio artístico foram alvo de empréstimo a várias exposições realizadas em Lisboa e nas Caldas da Rainha, fruto de colaborações com Museus, Sociedades Culturais e Câmara Municipal de Lisboa.
Em paralelo, no Museu João de Deus também se habilitavam professores a ensinar a ler pela Cartilha Maternal e foi ministrado o Curso de Didática Pré-Primária a jovens raparigas que quisessem obter formação de professoras do ensino pré-escolar pelo Método João de Deus. Após um estágio e exame, essas mesmas alunas ficavam aptas a trabalhar nos Jardins-Escolas João de Deus. De igual modo, este espaço museológico foi aproveitado para a realização das conferências pedagógicas destinadas a todas as professoras e estagiárias, que as deviam frequentar como formação profissional. Portanto, no Museu funcionavam os serviços escolares e administrativos da Associação de Jardins-Escolas João de Deus.
Por iniciativa de João de Deus Ramos foi criado o Círculo Camiliano, presidido pelo escritor Aquilino Ribeiro, que organizava sessões literárias no referido Museu abordando temáticas relativas às obras literárias de Camilo Castelo Branco.
Neste espaço João de Deus Ramos trabalhava, lia, pensava e dirigia os Jardins-Escolas João de Deus, frequentemente sentado na mesa de trabalho que tinha pertencido ao seu pai. Num desses dias de labor intelectual, sentiu-se indisposto. Era uma quinta-feira, dia 13 de novembro. Veio a falecer dois dias depois, a 15 de novembro na sua residência. O corpo foi trazido para o Museu onde lhe foram prestadas as últimas homenagens e de onde partiu o seu cortejo fúnebre.
Em sua homenagem as crianças do Jardim-Escola de Lisboa (Estrela) fazem uma romagem anual no dia do seu falecimento, depositando flores junto ao seu retrato que está exposto com esse propósito. Nesse mesmo dia são entregues diplomas de curso aos alunos finalistas da Escola Superior de Educação João de Deus e atribuídas medalhas aos funcionários que completam 25, 35 e 40anos de serviço em prol da Associação, reconhecendo assim o seu empenho e dedicação profissional. A conservação do espólio bibliográfico e artístico do Museu João de Deus, assim como a sua acessibilidade ao público, é a forma que temos de manter viva a memória do fundador deste espaço tão peculiar da cidade de Lisboa que está classificado como imóvel de interesse público.

Elsa Rodrigues


[voltar à página anterior]